"Todos dentre a elite alemã estavam envolvidos na criminalidade e na estupidez do regime nacional-socialista e estão carregados com esse envolvimento até hoje; pois essas pessoas ainda estão vivas e não querem admitir que o que aconteceu foi criminoso e louco, porque, então, eles também teriam de admitir que eles próprios são criminosos e loucos" (Eric Voegelin, Hitler e os Alemães)
Em Hitler e os Alemães (São Paulo: É Realizações, 2007), o filósofo político Eric Voegelin faz um profundo diagnóstico das condições intelectuais e espirituais da sociedade alemã da primeira metade do século XX, condições tais que possibilitaram a ascensão do nazismo ao poder. Diz Voegelin:
"Nosso problema (...) é a condição espiritual de uma sociedade em que o nacional-socialismo pôde chegar ao poder. Então, o problema não são os nacional-socialistas, mas os alemães, entre os quais personalidades do tipo nacional-socialista podem tornar-se socialmente representativas (...) o nacional-socialismo é, na verdade, precedido por uma sociedade em que ele chegou ao poder" (op. cit. p. 106).
Penso que uma análise como a de Voegelin seria imprescindível para a compreensão da hegemonia lulo-petista no cenário político brasileiro. O lulo-petismo também foi precedido por uma sociedade na qual ele chegou ao poder; uma sociedade que aceitou ser representada - não digo apenas eleitoralmente, o leitor já irá notar - por uma figura como Lula, que, tal como fora Adolf Hitler (ver Voegelin, op. cit. p. 88), é um político talentoso, mas sem qualquer outra qualidade (moral ou intelectual). Afora sua esperteza política, Lula é um homem sem qualidades. O que pretendo argumentar nesse texto é que, justamente por sua falta de qualidades pessoais superiores (falta da qual, no íntimo, se ressente, ainda que, em público, se jacte), e por sua malícia eleitoreira, Lula foi eleito pelos brasileiros como seu líder máximo e expressão visível de seu caráter. É triste constatar, mas a malícia política tornou-se um alto valor humano na sociedade brasileira.
Lula sabe que não presta, e vê no fato de conseguir impor-se a despeito de não prestar - ou, antes, precisamente porque não presta - uma grande e honorável virtude. Como sei que Lula não presta? Basta uma breve radiografia de sua figura para se chegar à resposta, evidente e cristalina não estivesse o país, ele próprio, mergulhado em estado de morbidez espiritual.
Quem é Lula? Trata-se, em primeiro lugar, de um homem que se gaba por nunca ter estudado, mas, graças a uma inteligência cruamente pragmática, ter subido na vida. Um homem que, no momento da comunhão católica (o rito fundamental da religião que ele professa seguir), comenta ser uma pessoa "sem pecados" (ver aqui). Um homem que, movido por um machismo vaidoso, e por um senso de humor tão elevado quanto a cloaca de uma pata, é capaz de contar ter tentado sodomizar um companheiro de cela - "não vivo sem boceta" (sic), confessa o "filho do Brasil", confundindo, ao que parece, alhos com bugalhos (ver o famoso artigo de César Benjamin sobre o caso do "menino do MEP"). Um homem que, ludibriando os próprios companheiros políticos, escondeu "um monte de bala paulistinha" embaixo do travesseiro, para burlar uma greve de fome (ver aqui, a partir dos 2'23'' de vídeo).
Lula é também aquele que, diante da escandalosa fraude eleitoral no Irã, e da violenta repressão aos manifestantes nas ruas, foi capaz de sugerir que tudo não passava de "choro de perdedor". Aquele que, em outra ocasião, mostrou-se indiferente e sarcástico em relação ao sofrimento dos presos políticos cubanos, refestelando-se, em compensação, com seus companheiros Fidel e Raúl Castro, líderes de uma das ditaduras mais sangrentas e duradouras da América Latina. Aquele que, no momento de intensa repressão e restrição da liberdade de imprensa por parte do governo de Hugo Chavez, afirmou haver "democracia até demais" na Venezuela. Aquele que não hesitou em chamar o genocida líbio Muamar Kadafi de "amigo e irmão".
Tratava-se em todos aqueles casos de pragmatismo político, justificavam seus asseclas. Sim, é claro. Mas, como recoda Voegelin sobre o caso alemão, esse tipo de pragmatismo é muitas vezes a face mais pusilânime do mal:
Tratava-se em todos aqueles casos de pragmatismo político, justificavam seus asseclas. Sim, é claro. Mas, como recoda Voegelin sobre o caso alemão, esse tipo de pragmatismo é muitas vezes a face mais pusilânime do mal:
"O problema é que o homem se torna completamente insignificante em comparação com sua qualidade de membro de um grupo de interesse. Ou seja, contanto que os do grupo de interesse (...) não sejam imediatamente atingidos em seus interesses, eles [os que defendem tal visão] não têm uma palavra a dizer sobre o fato de seus concidadãos serem assassinados, levados a campos de concentração, maltratados ou, finalmente, asfixiados com gás em Auschwitz - nem uma palavra contrária a todos esses crimes contra a humanidade" (op. cit. pp. 247-248).
Tal descrição bem poderia ser aplicada a Lula e muitos membros do seu partido. Eles não estão preocupados com violações dos direitos humanos em Cuba, no Irã ou na Líbia, contanto que seus interesses político-partidários - e suas bandeiras ideológicas - sejam preservados. A identificação de um petista com o partido é sempre maior do que sua identificação com a pátria ou mesmo com a espécie humana.
À parte seu pragmatismo político, Lula é também um homem emotivo, que chora à toa. Os motivos do choro são sempre os mesmos: sua infância pobre e sofrida, os preconceitos que teve de enfrentar por ter sido metalúrgico, a perseguição que pretensamente sofre por parte dos meios de comunicação e das "elites". Ainda que tenha sido o presidente mais paparicado pela imprensa e pela zé-lite, Lula faz manha. E esta é mesmo uma das características notáveis de sua personalidade: em paralelo à ausência total de sensibilidade diante do sofrimento alheio (se o pragmatismo político assim o exige), percebe-se na alma de Lula uma hipersensibilidade aos próprios sentimentos. Lula tem muita pena de si mesmo e, por isso, ele chora.
E como chora esse homem (o leitor experimente buscar "Lula chora" no YouTube)! Trata-se de um caso notável: Lula é duro feito côco frente aos presos cubanos e às vítimas da repressão iraniana, mas mole feito mingau de macaxeira quando fala de si próprio. Alguém consegue imaginar um Júlio César, um Napoleão Bonaparte, um Abraham Lincoln, um Roosevelt ou um Churchill derramando, em público, tantas lágrimas de autocomiseração? Pois Lula as derrama em profusão. E, mesmo assim, comportando-se como um sujeito débil e meloso, a opinião pública nacional insiste em considerá-lo um grande estadista, em vez de cobrá-lo da única maneira que se esperaria em casos como o dele: seja hômi, cabra da peste! Lula é mimado e exige sempre mais mimo. Caso contrário, chora.
Resta inevitável que um país siga os passos daqueles que elege como modelos de seu caráter coletivo. O Brasil como um todo - e mais especificamente sua classe falante - está ficando cada vez mais parecido com Lula. Em lugar da altivez, da serenidade e do mérito, o brasileiro tem optado, assim como o seu guru, pela auto-vitimização, pelo histrionismo e pela malícia. O mercado de vítimas está ficando inflado no país. Bons tempos aqueles em que o ditado "homem não chora" ainda tinha alguma relevância. No Brasil de hoje, homem não apenas chora, como chora por qualquer motivo, e especialmente por pena de si mesmo!
Um dos traços da personalidade de Lula que tem sido naturalizado e incorporado pela opinião pública nacional é a esperteza política. Para se compreender a fundo o "fenômeno Lula", seria preciso que se escrevesse uma obra intitulada "Lula e os brasileiros", a exemplo do livro de Voegelin. Mas um trabalho desse porte está além das minhas capacidades. E, infelizmente, não creio que haja no Brasil alguém em condições de realizá-lo. Um país que já teve um Gilberto Freyre, um Mário Vieira de Mello, um Mário Ferreira dos Santos, um José Osvaldo de Meira Penna e outros tantos grandes pensadores, hoje não conta com intelectuais que se aproximem da estatura de um Eric Voegelin.
Sem poder realizar sozinho o trabalho hercúleo de documentação e análise que seria necessário a respeito do tema, o que proponho aqui é menos uma investigações de causas do que uma amostragem casual do problema. Por ora, é tudo o que sou capaz de fazer.
Para o presente estudo de caso, examino um texto do jornalista Ricardo Noblat a respeito de um comentado artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) publicado por estes dias, e que versa sobre o papel da oposição no país. O artigo de FHC causou grande barulho graças a um trecho específico, distorcido e manipulado ao gosto do freguês. Nele, lê-se o seguinte:
“Enquanto o PSDB e seus aliados persistirem em disputar com o PT influência sobre os 'movimentos sociais' ou o 'povão', isto é, sobre as massas carentes e pouco informadas, falarão sozinhos. Isto porque o governo 'aparelhou', cooptou com benesses e recursos as principais centrais sindicais e os movimentos organizados da sociedade civil e dispõe de mecanismos de concessão de benesses às massas carentes mais eficazes do que a palavra dos oposicionistas, além da influência que exerce na mídia com as verbas publicitárias.”
De Londres, e em resposta ao artigo do rival (que, é claro, não deve ter lido, e se lesse não teria entendido), Lula respondeu de bate-pronto, com sua gramática e raciocínio tão peculiares:
“Eu. Sinceramente. não sei o que ele quis dizer. Nós já tivemos políticos que preferiam cheiro de cavalo que o povo (sic.). Agora tem um presidente que diz que precisa não ficar atrás do povão (sic.), esquecer o povão. Eu sinceramente não sei como é que alguém estuda tanto e depois quer esquecer do povão” (ver aqui).
A resposta de Lula não surpreende, é claro. Não se poderia esperar dele algo além de populismo rasteiro e mistificação, dois elementos constitutivos de sua natureza. O que espanta é o fato de Lula ter sido acompanhado por vários membros do próprio PSDB, que, cedendo à chantagem lulista - como haviam feito na última campanha eleitoral -, tentaram se esquivar da companhia de FHC, para poder disputar com o PT a hegemonia do populismo e do assistencialismo barato. Esforço inútil, é claro. Num concurso de populismo, vence, por definição, o mais populista - no caso, o popululismo.
Muito antes de conquistar o poder do Estado, o PT já vinha, há décadas, preparando a sociedade para recebê-lo incondicionalmente, por meio da estratégia gramsciana de ocupação de espaços. Intelectuais, artistas e jornalistas petistas e filo-petistas conseguiram, durante muito tempo, fazer-nos crer na idéia de que o PT era um partido ético (ver, por exemplo, essa declaração da filósofa petista - com perdão do oxímoro involuntário - Marilena Chauí). A lavagem cerebral foi muito bem-sucedida. Para muitos, mesmo o escândalo do Mensalão não conseguiu quebrar o encanto.
A despeito de ter deixado de ser operário há muito tempo e de ter ganho a eleição após uma campanha publicitária milionária, o epíteto "presidente operário" associado a Lula grudou feito cola nos corações brasileiros, tão afeitos a histórias bonitas. Consta que Napoleão Bonaparte teria dito que, para se fazer uma guerra, era preciso três coisas fundamentais: dinheiro, dinheiro e dinheiro! O mesmo se passa com campanhas eleitorais. Mas o brasileiro resolveu acreditar até o fim no conto de fadas do operário que, num passe de mágica, virou presidente e, porca miséria, continuou operário! (Imagine-se Abraham Lincoln, por ter sido balconista na juventude, sendo chamado de "presidente balconista" pelos norte-americanos. Impensável. Esse tipo de coisa só acontece no Brasil. Qualquer criança norte-americana sabe que um balconista, qua balconista, não tem condições de ser eleito presidente. Por aqui, ao contrário, não faltam marmanjos barbados com lágrimas nos olhos ao falar do "presidente operário").
Muito antes de conquistar o poder do Estado, o PT já vinha, há décadas, preparando a sociedade para recebê-lo incondicionalmente, por meio da estratégia gramsciana de ocupação de espaços. Intelectuais, artistas e jornalistas petistas e filo-petistas conseguiram, durante muito tempo, fazer-nos crer na idéia de que o PT era um partido ético (ver, por exemplo, essa declaração da filósofa petista - com perdão do oxímoro involuntário - Marilena Chauí). A lavagem cerebral foi muito bem-sucedida. Para muitos, mesmo o escândalo do Mensalão não conseguiu quebrar o encanto.
A despeito de ter deixado de ser operário há muito tempo e de ter ganho a eleição após uma campanha publicitária milionária, o epíteto "presidente operário" associado a Lula grudou feito cola nos corações brasileiros, tão afeitos a histórias bonitas. Consta que Napoleão Bonaparte teria dito que, para se fazer uma guerra, era preciso três coisas fundamentais: dinheiro, dinheiro e dinheiro! O mesmo se passa com campanhas eleitorais. Mas o brasileiro resolveu acreditar até o fim no conto de fadas do operário que, num passe de mágica, virou presidente e, porca miséria, continuou operário! (Imagine-se Abraham Lincoln, por ter sido balconista na juventude, sendo chamado de "presidente balconista" pelos norte-americanos. Impensável. Esse tipo de coisa só acontece no Brasil. Qualquer criança norte-americana sabe que um balconista, qua balconista, não tem condições de ser eleito presidente. Por aqui, ao contrário, não faltam marmanjos barbados com lágrimas nos olhos ao falar do "presidente operário").
Para qualquer pessoa alfabetizada e honesta, resta evidente que FHC não recomendou, nem de longe, que o seu partido "esquecesse o povão". O que ele disse, com razão, foi que o PT aparelhou os movimentos sociais, que ora se pretendem os únicos representantes legítimos do povão, e uma grande fatia da imprensa.
As aspas irônicas usadas por FHC nos termos "movimentos sociais" e "povão" pretenderam sugerir que o acesso direto às populações de baixa renda está totalmente controlado pelo PT, que, por meio de seus braços militantes (CUT, MST, UNE... Luis Nassif etc.), repassa àquelas pessoas toda sorte de mentiras e mistificações. FHC não disse para a oposição abandonar o povão. Disse apenas que, por uma questão estratégica, ela não deveria começar pelo povão, optando, antes, pelas parcelas da sociedade com maior acesso à informação. Antes de se dirigir à população de baixa renda, seria preciso criar condições para se quebrar o cordão de isolamento ideológico montado pelo PT, partido que compra consciências em troca de benesses, esmolas e cargos.
Eu, pessoalmente, não creio que FHC e o PSDB teriam condições de romper aquela situação, mesmo porque FHC foi um dos grandes responsáveis pela instituição do politicamente correto como forma de governar, contribuindo assim por criar o caldo cultural de onde o PT pôde emergir com toda a força. FHC é um pouco pai de Lula (e quem quiser se aventurar numa especulação freudiana acerca das obsessivas tentativas lulistas de matar o pai, fique à vontade).
De todo modo, reconheço que o artigo de FHC é lúcido, claro e pertinente, consistindo na seguinte tese: oposição tem que fazer oposição, ou seja, propor uma plataforma e assumir uma identidade diferentes daquelas do partido governante. Enquanto quiser ser mais realista que o rei - ou mais petista que o PT - a oposição está condenada à extinção. (Haja visto o preço pago por José Serra por sua eterna covardia e pusilanimidade).
Ricardo Noblat parece ter compreendido corretamente o artigo de FHC. No seu texto - intitulado significativamente (já explico) "A lição que Fernando Henrique não aprendeu" - ele afirma:
"O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não recomendou que a oposição desprezasse o povão e se fixasse na luta pelo voto da classe média. Sem o voto do 'povão' ninguém ganha. Mas é isso o que ficará do artigo. E é isso o que será explorado nas próximas eleições pelo PT e seus aliados. Porque numa passagem do artigo os mais apressados - e os maldosos - de fato podem entender que o ex-presidente sugere deixar o 'povão' para lá."
Escolhi falar do artigo de Noblat pela seguinte razão. Esse articulista costuma fazer análises políticas formalmente equilibradas e neutras, alternando, à primeira vista equanimemente, críticas e elogios tanto ao governo quanto à oposição. Não se pode identificar o Noblat, de forma inequívoca, com o jornalismo escandalosamente pró-governo de um Luis Nassif ou de um Paulo Henrique Amorim, nem, tampouco, com críticas mais contundentes ao governo, como as um Reinaldo Azevedo, um Augusto Nunes ou um Guilherme Fiuza. Noblat gosta de se apresentar, e muitos assim o percebem, como fundamentalmente neutro. O problema é que, não raro, Noblat é neutro ali onde a neutralidade já é uma tomada de posição. Mas isso fica para um outro post (para os interessados, recomendo uma e outra análises do blogueiro Felipe Moura Brasil - o Pim - sobre o modus operandi típico de Noblat).
Nas redes sociais, muito se discute sobre se Noblat é petista ou psdebista (tal alternativa, aliás, sendo a única escolha de vida concebida pela maior parte dos internautas brasileiros). Eu tendo a concordar com o articulista nesse ponto: não há nada em suas colunas que indique uma adesão incondicional a um ou outro partido. Não tenho a mínima idéia se Noblat vota no PT ou no PSDB. E, na realidade, isso pouco importa. Já escrevi em outras ocasiões que, ao contrário do que os brasileiros costumam achar, a disputa partidária não ajuda em nada a esclarecer as reais forças políticas em jogo no país. A bipolarização partidária (e mesmo eleitoral) entre PT e PSDB só serve para encobrir e mascarar a seguinte realidade: o PT exerce tamanha hegemonia política e cultural, que, como venho argumentando, a oposição julga necessário mimetizar ao máximo suas características para obter sucesso eleitoral. As eleições no Brasil são mero formalismo de superfície sobre um fundo político-cultural lulo-petista.
Mesmo que Noblat seja um eleitor do PSDB - e escolhi-o como objeto de análise justamente porque, no seu caso, não é fácil afirmar -, ele parece-me representar um caso clássico de petismo cultural. Noblat não faz propaganda petista como Luis Nassif e Paulo Henrique Amorim. Ele é petista por inércia, quase sem sentir. Uma vítima do petismo lubrificado, indolor.
Em relação ao artigo de FHC, apesar de tê-lo compreendido adequadamente, Noblat usou o padrão-Lula de julgamento, e censurou-o justamente por sua ausência de malícia política. Ao contrário de Lula, que é político 24 horas por dia, FHC teria sido sociólogo demais naquele artigo, deixando o político em segundo plano. De um ponto de vista sadio (leia-se, imune ao vírus lulo-petista), aquele seria um motivo de loas a FHC. Para Noblat, pobre infectado, trata-se de motivo de censura: FHC não aprendera a lição. Nas palavras do jornalista:
"O artigo divulgado esta semana foi escrito pelo sociólogo Fernando Henrique - não pelo político semi-aposentado que ele é. Se o político tivesse prevalecido sobre o sociólogo, o ex-presidente certamente não teria derrapado no parágrafo que está sendo lido como uma espécie de resumo do que ele quis dizer" (eu grifo).
Noblat mostra-se um tanto quanto indeciso. Primeiro, diz que FHC foi vítima de uma leitura apressada e maldosa. Em seguida, parece sugerir que a leitura não foi assim tão maldosa, porque afinal de contas, diz ele, FHC realmente derrapou naquele parágrafo sobre o voto do "povão".
Tal ambigüidade revela-se de todo na surpreendente conclusão geral do artigo, perfeitamente sintetizada no título: FHC foi vítima de uma leitura apressada e maldosa, mas, ao contrário do que poder-se-ia imaginar, Noblat sugere que o culpado é o próprio FHC, por sua suposta "derrapada". O colunista afirma com todas as letras: quem tem que aprender a lição é, no caso, a vítima da leitura desonesta, e não os seus autores (e, dentre eles, Lula em especial). Mutatis mutandis, o argumento equivale àquele dos que julgam que, num estupro, a culpa é da mulher estuprada - "ela provocou!".
FHC provocou, ou, como escreve Noblat, "derrapou". Qual foi a derrapada? A resposta é uma só: FHC falou a verdade. Falou não como o político que espera obter alguma vantagem eleitoral de suas palavras - como o fez Lula em sua crítica ao artigo -, mas como o analista que compreendeu e diagnosticou uma dada situação. Tal foi, na visão de Noblat, o grande pecado de FHC, o fato de ter sido muito pouco Lula em seu artigo. Ele foi verdadeiro e objetivo, escrevendo exatamente aquilo que enxergou. Que derrapada imperdoável! Noblat não considerou digna de uma reprimenda escrita a atitude desonesta de Lula ao distorcer, com fins eleitoreiros, as palavras de FHC. Em compensação, ele julgou necessário censurar FHC por ter permitido - Ó, que pecado! - que o sociólogo prevalecesse sobre o político.
Adotando aquilo que poderíamos chamar de "padrão Lula de qualidade", Noblat consegue transformar em vício a maior virtude do artigo de FHC, qual seja a de escrever como o analista em busca da compreensão da realidade, antes que como o político em busca de votos.
Num país moral e espiritualmente são, Noblat escreveria uma coluna intitulada "A lição que Lula não aprendeu". No Brasil, esse reino de ponta-cabeça, a vítima faz as vezes do agressor e vice-versa. A ausência de malícia política é, por aqui, considerada uma falha grave.
Num país moral e espiritualmente são, Noblat escreveria uma coluna intitulada "A lição que Lula não aprendeu". No Brasil, esse reino de ponta-cabeça, a vítima faz as vezes do agressor e vice-versa. A ausência de malícia política é, por aqui, considerada uma falha grave.
A expansão e consolidação da estupidez lulo-petista jamais será compreendida sem uma análise de fenômenos como o texto de Noblat. Cito Voegelin mais uma vez sobre o caso alemão: "A estupidez tem sempre de ser entendida em relação com o contexto social e histórico" (op. cit. p. 134).
Noblat tem, evidentemente, o direito natural e constitucional de expressar sua opinião. Mas, num contexto político que caminha a passos largos para a completa hegemonia partidária e para o totalitarismo (vide os incansáveis projetos de "controle social da mídia"), um jornalista não tem o direito de corroborar a estupidez criminosa de um líder político de massa. Há tratamento para o lulo-petismo. Noblat só precisa se medicar.
Interessante. Da leitura do livro do Voegelin("Hitler e os alemães"), também identifiquei uma significativa semelhança, guardadas as devidas proporções, com as características do petismo-lulista e com a natureza do Lula. Parece que a matéria prima é parecida. A manipulação, a ausência moral e a fuga da realidade são aspectos assustadoramente similares.
ResponderExcluirSP
Que texto belíssimo, Flávio! Texto salvo no meu arquivo pessaol.
ResponderExcluirFlávio,
ResponderExcluirexcelente texto. Como costuma dizer Augusto Nunes, vivemos a "era da mediocridade". E essa mediocridade está instalada - ô se está - na imprensa.
Enquanto isso, Gramsci avança...
Thiago - RJ